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Mulheres que venceram o câncer de mama redescobrem a vida nas águas de Curitiba: “Aqui, a gente só fala em vida”

Grupo feminino pratica canoagem chinesa milenar e transforma recomeço em sinônimo de força e esperança

Nas águas tranquilas do Parque Náutico de Curitiba, um som rítmico quebra o silêncio das manhãs de sábado. São os tambores do Dragon Boat, um barco longo, colorido e cheio de histórias.
Dentro dele, 24 mulheres remam com vigor, alegria e propósito. Todas têm algo em comum além do amor pelo esporte: venceram o câncer de mama e transformaram a dor em movimento.

Das cicatrizes à superação

A professora Patrícia Olibratoski, de 50 anos, é uma dessas guerreiras.
Ela descobriu o câncer um mês depois da irmã, Andréa, também ser diagnosticada, em 2021. “A minha irmã salvou minha vida”, conta emocionada. “Meu tumor estava nas axilas. Se não fosse por ela, eu não iria ao médico.”

As duas enfrentaram a doença juntas — com coragem, humor e resiliência.

“A gente não desmoronou. Colocava a peruca e ia para o barzinho. O câncer não tirou a nossa vontade de viver”, relembra Patrícia, rindo.

Após a cura, ela conheceu o grupo durante o Outubro Rosa e, mesmo com medo da água, decidiu remar. Hoje, o treino é o ponto alto de sua semana.

“Aqui ninguém fala de câncer. A gente só fala em vida. E era exatamente isso que eu estava procurando.”

Um esporte milenar, um novo começo

A canoagem em estilo Dragon Boat tem origem na China antiga e, há décadas, é usada como terapia física e emocional para mulheres que enfrentaram o câncer de mama.
Pesquisas do médico canadense Donald McKenzie, pioneiro no estudo, mostraram que o esporte ajuda na recuperação muscular, na prevenção do linfedema e na melhora da autoestima e da qualidade de vida.

O grupo curitibano, conhecido como Canohá Dragon Team, se reúne todos os sábados, às 8h, no Parque Náutico. Para participar, é necessário apresentar um documento que comprove a cura do câncer de mama.
As remadas sincronizadas, o som dos tambores e o espírito coletivo formam uma terapia natural — e um lembrete poderoso de que a vida pode recomeçar de maneira ainda mais intensa.

“Mulheres juntas têm uma força imensa”

A capitã do time, Deborah Voss, conhece bem o significado da palavra “recomeço”.
Diagnosticada com câncer de mama em 1998 e com recidiva em 2016, ela começou a remar após recomendação médica, como forma de fortalecer o corpo depois de uma cirurgia de tireoide.

“Fiquei com sequelas físicas e emocionais, mas aprendi que mulheres juntas, no mesmo propósito, têm uma força e uma potência imensas”, conta Deborah.

Foi ela quem decidiu reunir outras sobreviventes e fundar o grupo em Curitiba. Desde então, a equipe se tornou um espaço de acolhimento, amizade e superação.

O poder curativo do movimento

A mastologista Karina Anselmi explica que a canoagem é mais do que uma atividade física: é uma ferramenta de reabilitação.
Pacientes que passam por esvaziamento dos linfonodos axilares — glândulas responsáveis pelo controle de infecções — podem ter limitações no braço operado.

“O remo ajuda a recuperar o movimento, reduz o inchaço e previne o linfedema. Além disso, o impacto emocional positivo é enorme”, explica a médica.

Estudos indicam que a prática regular de atividade física pode reduzir em até 30% o risco de desenvolvimento do câncer de mama, reforçando a importância do exercício na prevenção e na recuperação.

Ritmo, união e renascimento

No Dragon Boat, cada mulher tem um papel essencial.
A drummer, posicionada na frente, dita o ritmo batendo em um tambor.
A timoneira, na parte traseira, conduz o barco pelas águas.
Entre elas, um exército de sobreviventes remando em perfeita harmonia — como se, a cada remada, empurrassem para longe o medo, a dor e o passado.

“Participar do grupo é ressignificar a vida. É provar que o câncer pode deixar marcas, mas não define quem somos”, resume Deborah.

Das águas, um novo olhar sobre a vida

O Canohá Dragon Team é mais do que um grupo esportivo — é um símbolo de renascimento.
Para essas mulheres, o barco não é apenas uma embarcação, mas um espaço de liberdade, amizade e esperança.
A cada treino, elas reafirmam um mesmo lema:

“Aqui, ninguém fala de câncer. Aqui, a gente fala de vida.”

Maria Paula Carnelossi

Por: Maria Paula Carnelossi | Folha Regional

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